29 dezembro 2009

Férias



Quando o avião pousou em Vitória, achei que o caminho estava pelo menos na metade. A uma hora e pouco que levamos entre Guarulhos e a capital capixaba me dava sinais de que a viagem seria curta e rápida.
Ledo engano.

No táxi, o motorista dizia que de Vitória à Conceição da Barra eu gastaria mais cinco horas e pouco de viagem. Achei se tratar de uma enorme bobagem dele, já que a distância entre as duas cidades não chega na casa dos 300 km.
Enquanto o carro branco fazia o trajeto aeroporto-rodoviária, achei por bem dar uma olhada na Internet para consultar horários da passagem entre as duas cidades do Espírito Santo.

Segunda má notícia. A companhia Águia Branca, a única que faz o trecho, só tinha passagem as quatro e meia, e ainda nem passávamos do meio dia.
As coisas não andavam boas. Logo na chegada ao terminal de ônibus, apenas uma empresa tinha uma fila enorme: a minha. A tal da águia branca tinha pelo menos umas 30 pessoas na espera e atendia com dois funcionários.

Hora da Internet novamente. Ainda na fila, acessei o site da empresa. Os 15 lugares restantes para o único coletivo do dia, agora eram seis. Ainda na fila, me pus a comprar o bilhete pele rede.

Sem perder meu lugar na espera física, é claro.

Verdade que o atendimento na web é rápido. Mas como sempre tem um cadastro a ser feito, uns dados a preencher..

Ganhei no máximo duas casas na fila e as duas passagens virtuais já estavam compradas. Era só esperar por um email de confirmação e ...

Seis passagens restantes não permitem esperar pelo tal email.

Ligo na companhia, mais dois, três minutos na espera. (Ainda no final da fila, que realmente não andava). A simpática menina confirma que os assentos 1 e 2 estão no nome de Guilherme Prado.

Ufa.

Pena que o relógio não colaborou; e os ponteiros estão ainda longes das 16h30, escritas nos meus bilhetes de embarque.
Café, banheiro, revistaria, leitura, Internet... de tudo um pouco. As mais de horas passaram.

No meu lugar, logo atrás do comandante, vejo entrar todo tipo de gente a uma péssima notícia: o cara do táxi tinha razão. O motorista se apresenta e diz a todos os passageiros que o trecho será cumprida em cinco horas e meia.

Como a distância é inferior a 300 km, eu que sou bastante modesto em ciências exatas, chego a conclusão que meu destemido capitão irá cruzar as estradas capixabas com média inferior a 60 km/hora.

Na verdade não é assim. O ônibus é bem mais confortável e espaçoso que o avião da Gol que peguei no começo do dia. Mas ele para tanto durante o trajeto que me lembra a via-crúcis.

Um punhado de cidade que nunca ouvi e mais um monte que não lembro o nome...
Pouquinho para frente das dez da noite, chegamos a rodoviária. Só nós dois. Todo o resto foi descendo pelo caminho, seja na própria Conceição ou nas infinitas paradas que o coletivo fez durante o dia.

A rodoviária é bem simples e está simpaticamente fechada. Pior, eu ainda tenho que cortar mais quase 30 km, a maioria de terra, para chegar ao destino final. E olhei que pensei em chegar lá às seis da tarde.

Não, não tem ônibus àquela hora. O ponto de táxi da cidade está vazio e apagado. Mas tem um número de telefone. Ligo, é claro, o número fixo toca ao meu lado.

Uma farmácia está aberta, bem a frente. Não, não vou comprar um dormonide e passar a noite na rua. Nem a pau.

Peço o fone de um taxista. Solicito demais, Tião da Farmácia me diz que é comum os motoristas fazerem o trajeto que preciso. E me dá o número de um, são oito os profissionais que atende a cidade toda.

Dede, não atende. Ligo de novo. Passa para caixa-postal direto. Parece que a coisa vai piorar.

A boa notícia.

Aparece o carro do Dede, com outro cara. O bravo motorista é separado e foi ficar com a filha, deixou o carro com o amigo para fazer o serviço.

Setenta reais a menos no bolso, parto finalmente ao vilarejo.

A estrada é boa. A falta do asfalto é opção dos nativos. Querem manter a reserva e a vila longe das modernidades e do excesso de turista. Quarenta e poucos minutos, chego finalmente em Itaúnas.

Hora de curtir minha semana de férias.

23 dezembro 2009

O meu injusto balanço de 2009

Fazer um balanço do ano para mim é sempre cometer uma enorme injustiça. Eu não consigo lembrar de muita coisa, e acabo sempre por deixar fatos marcantes e importantes de fora. E o pior: acabo por listar alguns que não tem grande valor. Ou seja, minhas vagas lembranças não são lá muito seletivas.
Mesmo assim, vou tentar ver o que lembro.
Meu pai está melhor de saúde. Não sei dizer ao certo se ele voltou a ter crises de depressão esse ano. Mas é fato que ele chega ao final da temporada em grande fase. Dezesseis quilos mais magro, com o diabete controlado. Trabalhando e presente em casa.
Minha mãe virou guerreira. Assumiu papéis que não eram dela. Sonha com a casa nova. Pinta, borda e cria. Curte as meninas que não teve como filhas, mas que Papai do Céu lhe deu em abundancia como netas.
Ganhei a Malu, uma menina linda, cheia de saúde e que, com parcos nove meses, já tenta os primeiros passos. O primeiro ano completo da Marina a colocou na fase mais linda da vida. O aprendizado constante é mágico, apaixonante e acaba com meu coração.
Bons amigos voltaram para mais perto. A curtição ao lado deles foi fato marcante, se bem que de uns meses para cá eu fiquei um tanto mais recluso. E os grandes momentos com eles foram mais presentes no primeiro semestre.
Depois de uma justa e necessária temporada sozinho, parece chegada a hora de tentar a companhia novamente. Por acaso, como gosto que seja, a vida me deu provas que era hora de tentar.
Operei a vista. Comprei o carro. Mas segui com a moto. Perdi a Lua, valorizei o Fred. Viajei a passeio. Trabalhei muito, como sempre. Não lembro ter chorado. Ri demais. Fui Tio, quase uma rotina.
Bebi com os amigos. Comi demais com eles. Voltei a nadar. E lá se foram cinco quilos. Emprestei minha cama. Perdi o reinado. Dormi no chão, na sala, e fora.
Curti o melhor carnaval do mundo. Não fiz a festa de 30 anos, com o samba e tudo, como queria.
Melhorei. Tenho orgulho da minha história. Entendo melhor meus erros. E tento os respeitar demais. Sem eles não seria esse meu caminho. Não ligo que apareçam as primeiras rugas e os cabelos brancos.
Me chatearia não ter história para contar.

12 novembro 2009

30 Vela, no singular mesmo

Achei que o dia do seu aniversário era uma boa data de começarmos com isso. Doze de novembro. Um dia sem graça. Um mês depois do dia de Nossa Senhora Aparecida, minha padroeira, e dois após o aniversário do Seo Ademir, meu pai.
A história começa sábado passado, quando o Bat entrou no campo aconteceu o inevitável. A pergunta veio na minha cabeça: “há quanto tempo, a gente não consegue ter o prazer de jogar bola junto”.
Tá certo, nunca fomos do nível dele. Mas também estávamos longe de não sermos escolhidos para os dois primeiros times, e assim ficar para na incômoda situação de o primeiro próximo, posto sempre ocupado pelo saudoso Zé Asa.
Difícil entender quando as coisas começam, ganham velocidade, chegam ao auge, diminuem, até ficarem quase paradas. E voltam de novo, correm, atingem o topo...
Apesar da quadra ser o ponto alto, tudo se deve ao palco. Pelo menos é o que diz minha péssima memória. Não fostes tu o protagonista, o dono da porca; e eu o santo mudo, não teria a mesma força.
Sob o comando das três irmãs, aprendemos juntos a brincar de fantasia. De se comunicar sem palavras e brincar com o improviso. De estar pronto para o erro, em estado de alerta para superar o esquecimento, e doido de vontade de fazer graça.
Parece bobagem. Mas quando ouço você dizer que sabe como jogo, é porque conhece minha forma de pensar. Entende o que eu digo, mesmo sem pronunciar uma palavra. E sabe como funciona meu improviso.
O palco é tão importante quanto o campo. É ali, vestido e fantasiado como nos nossos sonhos, que conseguimos sair do nosso papel, da nossa vida. Para estar por poucos momentos em lugares que nunca chegaríamos no dia-a-dia.

12 agosto 2009

Os astros

Será mesmo que o dia e o mês de nascimento de uma pessoa são assim tão importantes para definir um caráter, um jeito de agir? Terá isso mais força que a educação, a criação, a religião, as escolhas e as amizades que um indivíduo fez na vida?
Mesmo sabendo que as quatro semanas lunares tem 28 dias e o mês tem 30, 31, 28, as vezes 29?
Por que será que umas pessoas querem antes saber o signo e depois, a família, os amigos, a religião, a história?
Nascido em gêmeos, me considero bem mais que isso. Sou filho de professores, irmão de músicos e militares. Neto de descentes de escravos, portugueses e espanhóis. Amigo de gente de tudo quanto é jeito, só para dar o exemplo familiar.
Com todo respeito a astros, estrelas e planetas. Vocês intrigam, ajudam, indicam o bom caminho aos navegantes e as marés aos pescadores. Mas da minha história e do meu jeito de ser, desculpem, vocês não dão palpite.

09 agosto 2009

Dia dos pais

Papai do Céu, o primeiro e mais importante, obrigado pelo seu substituto..

Meu Pai, obrigado pelo carinho, educação e amor que dá desde sempre.

Meus três irmãos, obrigado por terem me dado o prazer a honra de ser pai dos vossos filhos algumas horas por semana.

Fiel, filho, irmão, tio e padrinho.

Na certeza que e alguns momentos desses meus papéis também sou pai de vez em quando.

08 agosto 2009

Doce companhia

As poucas mulheres que passaram uma noite comigo, sempre disseram que sou bom de cama. Não, calma. Isso não faz nenhuma menção com meu modesto desempenho sexual. A afirmação tem relação direta com a absurda facilidade que tenho de dormir.

Basta apenas eu dizer o bom e velho “boa noite”, e fechar os olhos. Poucos segundos separam as derradeira frase, da tremida que anuncia minha estada nos braços de Orfeu.

Sou melhor ainda quando entro no avião. Se durmo pouco na noite anterior, então, ninguém me segura. Antes mesmo de levantar vôo, eu já estou em alfa. Raras vezes, percebo o decolar.

Pois bem. Foram pouco menos de três horas de repouso entre o delicioso show da Banda Glória e o despertar para o trabalho do sábado cedo. Mais três voltas do ponteiro e o almoço, depois direto para o aeroporto.

O trecho que divide as capitais paulista e carioca demora pouco mais de meia hora. Tem mais aquele tempo até levantar asas, daria uns cinqüenta minutos de sono...

Daria...

Ao ver que ao lado minha poltrona encontrava-se uma linda menina de sete anos com a perna quebrada, percebi que meus planos corriam sério risco. Antonia, galega como a Maria e o Heitor, voltava do Chile e me ganhou de cara.

Foram cinqüenta deliciosos minutos de vôo. A história de como quebrou o fêmur quando esquiava. A vida em Petrópolis, a casa de praia e Angra, as duas semanas a mais de férias pela gripe, suína, tudo..

Inteligência, simpatia e ingenuidade impressionantes. Um sorriso lindo, uma altivez cativante..

Não dormi, mas descansei como se tivesse hibernado por anos...

11 julho 2009

O imã e o pastor

Quando entrou na sala, o imã Muhammad Ashafa deparou com seu maior inimigo, o pastor pentecostal James Wuye. Sentiu seu sangue borbulhar. Ali estava o homem que havia liderado a milícia cristã que matara seu mentor espiritual, dois primos e vários amigos. Muhammad virou o rosto. Ao ver o imã, um arrepio de ódio trespassou o corpo do pastor. Sua mão esquerda apertou a direita. Ele sentiu a textura fria da prótese. O muçulmano que respirava o mesmo ar que ele na sala repentinamente abafada comandara a milícia islâmica que decepara seu braço com um golpe de machete. Líderes religiosos, eles haviam sido chamados à casa de governo de Kaduna, no centro da Nigéria, para discutir uma campanha de vacinação contra a poliomielite. Entre os dois, pairava o fantasma de milhares de cadáveres. Seu único desejo era matar. Um ao outro.

O que aconteceu nos minutos seguintes vem mudando o mundo – deles e de todos nós. Um jornalista que os conhecia puxou o pastor e tocou o ombro do imã. Apresentou-os. Juntou suas mãos e disse: “O futuro deste país está em suas mãos. Vocês podem construir ou destruir a Nigéria”. Os dois se encararam, sem armas pela primeira vez. “Até então, eu vinha rezando com fervor por uma oportunidade de vingar minha mão”, diz James. “Quando ele pôs a mão sobre a minha, meu coração estava disparado”, afirma Muhammad. “Como vou me relacionar com esse cara? E as minhas feridas? E a minha vingança? Quando o vi, senti todas as feridas que cicatrizavam dentro de mim abrindo novamente. Eu suava. Meu rosto sorria para ele, mas, por dentro, eu fervia.”

O pastor James Wuye e o imã Muhammad Ashafa contaram sua história durante sua primeira visita ao Brasil, no final de junho, para trazer sua experiência ao Antídoto – Seminário internacional de ações culturais em zonas de conflito, a convite do Itaú Cultural. Ao ouvi-los, a pergunta que ecoa sem parar é: como foi possível para aqueles dois homens superar tanto ódio, tanta dor, tanto sangue derramado?

James e Muhammad são a síntese do conflito religioso que divide a Nigéria, ocupada ao norte por muçulmanos, ao sul por cristãos. No centro do país, Kaduna, onde ambos vivem, é espremida por forças opostas. As disputas religiosas são a porção mais visível das diferenças acirradas pela colonização britânica. Em 1914, os ingleses juntaram sul e norte, num país inventado em gabinete. No lado de dentro das fronteiras riscadas no papel, uma população dividida em 250 etnias, com costumes e culturas diferentes, fervilhava em ódios mútuos. Com 150 milhões de habitantes separados em trincheiras de rancor, a Nigéria está sempre a um segundo de explodir.

Para o pastor e o imã, o ponto de virada começou em maio de 1995, naquele aperto de mãos na sede da administração de Kaduna. Mas somente um ano depois voltaram a se encontrar em público para o primeiro de muitos diálogos inter-religiosos. Durante o ano que passou, Muhammad deu o primeiro passo, ao procurar James na igreja. Ao vê-lo em território inimigo, o cristão concluiu que o muçulmano pretendia obter informações estratégicas para usar no próximo conflito. Vinha não para se aproximar, mas para espionar. Estava certo, como confessou Muhammad depois. Mas, aos poucos, algo começou a acontecer com eles. Dentro deles. Descobriram-se mais semelhantes que diferentes.

O muçulmano e o cristão perceberam que sua infância fora parecida, que vinham do mesmo gueto, tinham os mesmos medos e as mesmas aspirações, ambos olhavam para mulheres bonitas e gostavam de futebol. “Quando conversamos, descobrimos que ambos tivemos uma juventude bastante aventureira. Eu perguntava: ‘Você também fez isso? Oh, boy!’”, diz o pastor James. Trocam olhares cúmplices. Mas nenhum dos dois conta o que ambos tinham feito na tal “juventude aventureira”.

09 junho 2009

Caixa de entrada

Amigo de longa, me mandou esse email. Na verdade, mandou para bastante gente, eu só tive a honra de estar na lista..

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“Combati o bom combate, acabei a corrida, guardei a fé”, assim é um trecho da Segunda Carta de São Paulo a Timóteo, capítulo 4, versículo 7.

Assim, citando uma das mais belas passagens da Bíblia e fonte para jamais me deixar abater diante das dificuldades, que me deparo com o término de uma grande jornada. A partir sai o homem, o marido e entra em primeiro e único lugar o pai.

Encerra-se um ciclo de pensar em mim e parte para cuidar única e exclusivamente em outra vida, mas não há o temer. Em 37 anos de vida, a esmagadora deles muito bem vividos, eu aprendi que só não há jeito para escapar da morte, é clichê, é?? Mas foi o que de melhor me veio neste momento.

Pois bem, amigos, é hoje o primeiro grande dia de muitos que virão pela frente. Por volta das 16h30, dona Edna dará a luz a nossa amada filha, quero compartilhar com todos vocês a alegria de colocar um mais um ser humano neste mundo e celebrarmos a vida, dom maior que Deus nos proporciona.

São muitos os que contribuíram para que o casal Edna e Rosa chegasse neste momento certo de que fizemos a melhor escolha de nossas vidas, que seria cometer grandes injustiças passar a citar este ou aquele, com o risco de deixar escapar alguém.

Em todo caso, fica aqui o convite para vocês conhecerem mais tarde a Bagunchinha, que depois de idas e vindas será registrada como Anna Rhubia Santos Rosa..."

Lindo, meu amigo



26 março 2009

De onde ele nunca deveria ter saído

Meu amigo liga, quer conselhos sobre uma nova paquera. Conta que teve um lance sensacional com ela. Dois dias de carinho, amor e todos os mais picantes detalhes, que não me permito tornar público.
Filho da garoa e neto da gandaia, ele parecia disposto a largar a mal falada família para se entregar ao novo amor. Fez tudo como manda o figurino. Ligou e escreveu à nova amada. E avisou aos amigos que estava em viés de alta, tal como a CELIC.
As ligações, para sua nobre surpresa, não foram sequer atendidas. Azar, pensou ele. Tentou os recursos digitais, email, Orkut e mais um monte de coisas que, com minha ignorância nesse sentido, não sei explicar.
Não houve, mais uma vez, nenhuma evolução no contato direto.
Já desolado, ela teve a impressão de ter a visto na rua. Encheu o peito de coragem e pumba: escreveu de novo, via mensagem de celular. Era o dia de sorte do meu bom amigo. Cinco minutos depois, mensagem respondida.
Ele fez a tréplica, tal como um político nos debates eleitorais. E era mesmo a lua dele. Mais rápida ainda a resposta voltou. Era a hora da cartada final.
A mensagem dele era simples, queria ligar para ela e parar de mandar mensagem, que ele diz detestar fazer.
Foi seu erro.
Ficou sem resposta. Tentou ligar, não foi atendido. Desolado.
Ligou para sua mãe e avó. Horas depois estava de novo, sob a saia da garoa, de mão dada com a gandaia, de onde, agora ele parece saber, nunca deveria ter saído.

11 março 2009

O trem que chega é o mesmo trem da partida

O trem que chega é o mesmo trem da partida

A frase não é minha, alias, acho que nunca fiz uma sentença minha mesmo. Tudo que escrevo ou falo são palavras e pensamentos picados que juntei ao longo e transformei no meu repertório.
Mas bem que poderia ter sido criada por mim. Poucas vezes um grupo de palavras juntas expressou de forma tão clara o meu sentimento durante um dia.
Ele começou cedo, quando a luz azul do meu celular avisou que uma mensagem de texto me aguardava para ser lida. Podia ser tanta gente, tanta coisa, que esperei um pouco para levantar da cama e ler.
Domingo, as oito e pouco da manhã, não é comum receber mensagem, ainda mais sendo eu um rapaz solteiro. A noite curta e o pouco tempo de sono me impediram de ver na hora o que aquela luz azul queria me dizer.
A frase era curta, mas a notícia era ótima. Dizia assim: Sua sobrinha nacerá hoje (É, a emoção fez meu irmão esquecer a letra S que vem antes de C).
Os mais de 500 quilômetros que me separavam do acontecimento me deram um misto de emoções. A felicidade pela chegada da Malu, que já veio com apelido. A apreensão que envolve o parto e, por incrível que pareça, a saudade de alguém que ainda nem tinha nascido.
Dali um tempo a ansiedade me fez ligar para saber notícias do parto. Dessa vez a conversa foi mais longa e a notícia péssima.
Não, nada em relação à Maria Luiza que ainda esperava a chegada do médico para mostrar a carinha linda que vi dias depois.
Mas justamente na outra ponta da família, uma estrelinha nos deixava para morar ao lado do Papai do Céu para sempre.
Mais uma vez a distância me derrubou. Queria estar perto, celebrar com um irmão e chorar com o outro. Ver o sorriso de uma cunhada e sofrer com as lágrimas da outra.
Cheguei a pedir a Deus para que as coisas não acontecessem no mesmo dia. A chegada estava marcada para o dia 11 e a partida, que já sabíamos era inevitável, aconteceria quando Deus mandasse.
Errado. As duas coisas vieram no dia que Papai do Céu entendeu ser o melhor.
O trem que chega foi, de fato, o mesmo trem da partida.
Ou como me disse aquele metido a ateu: Foi-se uma estrela e chegou uma outra.